por Grupo de Trabalho Moda e Beleza
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Foto: Collective for us all |
Para encerrar este especial, vamos acompanhar uma
entrevista e o depoimento de mais uma linda crespas plus size. Hoje é a
vez de Gisella Francisca, blogueira, autora do blog Collective for us all, e Thays.
Gisella Francisca - O blog começou como uma
extensão virtual dos meus sketch
books, mas bem menos autoral. Era como uma coleção de imagens e outros
tipos de conteúdo que eu achava na internet e queria compartilhar ou reunir num
só lugar. Depois eu fui incluindo conteúdo próprio, como meus textos e
reflexões, por exemplo. Depois vieram as fotos próprias. Quando comecei a
namorar meu atual namorado, eu passei a levar fotografia mais a sério, a
investir em equipamento e workshops profissionais e a coisa foi
evoluindo e meu blog foi virando o meu canal de lifestyle com bastante conteúdo de estilo e
beleza – que são dois assuntos que estão amplamente presentes na minha rotina.
MBP - Sempre gostou de moda? Quando seu interesse surgiu?
GF - Eu sempre gostei de
estilo, não necessariamente de moda. Desde criança sempre fui chegada a me vestir
bem. Acredito que por influência da minha avó, mãe e das minhas tias. Uma delas
morava na Europa e todas as vezes que vinha trazia uma novidade pra eu me
inspirar. Eram os anos 80, então tinha bastante novidade chegando aqui no
Brasil. Eu era novinha pra assimilar aquilo como tendência, mas fazia a minha
leitura e escolhia as minhas peças. Fazia minhas próprias combinações, sob
supervisão, claro. Mas o fato de sempre ter sido livre pra me vestir como
queria e de ter influências dentro de casa contribuíram pra que eu
desenvolvesse a consciência do estilo, por assim dizer. E sim, eu gosto de
moda, claro. Mas estilo é bem mais a minha praia. Há algumas semanas li uma
entrevista do estilista Erdem na revista AnOther e a frase resumia exatamente o
que eu penso sobre moda e estilo: Moda é algo projetado, criado, imaginado.
Estilo é instintivo. Ponto!
MBP - De onde surgem e quais são as suas influências de moda?
GF - Não me considero uma
pessoa exatamente influenciada "pelas modas". Até porque tenho muito de cultura
vintage no meu estilo. Se fosse influência de moda, eu estaria meio last
season [risos]. Mas claro que tenho a minha interpretação das páginas da
Vogue do mês, por exemplo. Minhas influências são uma coleção de experiências que já tive na vida, lugares
que fui, coisas que vi, senti. Mas, ao colocar isso tudo em prática, na forma
como me visto, é o que eu chamo de estilo. Essas minhas experiências somadas ao
meu gosto pessoal criam a minha leitura do que vejo nas ruas, vitrines, blogs e
revistas. Meu jeito de me vestir diz muito sobre mim. Gosto de mixes coloridos,
divertidos, mas elegantes e comportados sem serem puritanos ou chatos. O estilo da Miroslava Duma me agrada muito. Tenho prazer em ver as fotos de
street style dela. A Iben, do Despite Color também é uma das minhas preferidas,
assim como a Blair Eadie do Atlantic Pacific. A StyleDevil, Marianne Teodorsen,
da Noruega é muito diferente e inspiração também. As suecas Sandra Beijer e a
Elsa Bilgren também. A Nadia Aboulhosn é um colírio pros olhos de quem gosta de
estilo com certeza. São os principais blogs que eu visito quase diariamente.
MBP - Sempre esteve segura com seu corpo e seus
cabelos ou já quis ser diferente?
GF - Nem sempre, obviamente.
Hoje em dia eu me conheço melhor, sei mais sobre mim, o meu valor e o meu
caminho na vida. Essas coisas me fazem mais segura do que há alguns anos. Mas
claro que todo mundo tem seus dias nublados, isso é normal. Mas, em geral,
posso dizer que quase sempre estive segura com a minha imagem. Mas isso passa
por muitas coisas além do espelho. Coisas às quais somos expostos desde
pequenos influenciam muito nossas ideias acerca de valorização pessoal. Eu
sempre gostei de comer bem e minha quantidade de exercícios nunca foi maior do
que a quantidade de coisas gostosas que eu comia, por isso, magra eu não seria.
Minha família é de pessoas mais carnudas, as mulheres são encorpadas e de
cabelo natural, acredito que isso ajude muito. Claro que já quis acordar igual
a Beyoncè, mas ter umas dezeninhas de quilos a mais nunca me matou de tristeza.
Posso dizer que tenho a cabeça bem no ligar em relação à minha imagem. Olho no
espelho e a sensação sempre foi boa.
MBP - Já sofreu algum tipo de preconceito?
GF - Se já sofri eu não
entendi ou não assimilei como preconceito por isso não me lembro. Já tiveram
situações em que, se eu fosse ativista, diria que era preconceito, mas nunca
foi nada explícito que merecesse minha atenção e/ou reação nesse sentido.
MBP - O que você acha de no mundo da moda haver poucas modelos negras plus size?
GF - Falta de contato com a
realidade. Pouca exploração de nicho de mercado, erro de branding e uma pena,
em geral. Não sou muito ligada nas celebridades de TV, mas, o número de negras
na Caras reflete a realidade? Acho que não e o Brasil está longe disso, eu
acho.
MBP - Acha que é possível se vestir bem tendo
pouca grana?
GF - Claro. O parcelamento
ajuda muito, né [risos]? Mas, brincadeiras à parte, é sim. Ter bom senso,
estilo e consciência do que fica bem em você e do que é adequado a determinadas
situações faz a vida muito mais fácil, eu acho.
MBP - Qual a importância de assumir o cabelo
crespo?
GF - A mesma importância de
assumir um cabelo liso. O que quero dizer é que é mais uma questão de aceitação
própria do que do formato do cabelo. Essa é uma discussão enorme,
evidentemente. Mas, quando eu faço apologia ao cabelo natural e aceitação do
corpo, é visando atingir uma mulher que tem qualquer problema de autoestima
relacionado às imagens e ideias deturpadas de beleza que temos em larga escala
no Brasil e no mundo. Minha ideia vai mais em direção ao amor próprio em geral
do que ao cabelo crespo em si.
MBP - Qual a sua mensagem para nossas meninas sobre ser negra, crespa e plus size?
GF - A minha mensagem é de amor e aceitação
pessoal pra qualquer mulher e não pra um grupo apenas. Eu sou a Gisella
Francisca, uma mulher com diversas características. Ser negra, crespa e vestir
tamanhos considerados maiores são apenas três delas. Isso significa que ficar
levantando bandeira de um grupo pode ser bom, não julgo isso. Mas a minha
bandeira é a do amor próprio, respeito a si e aceitação do que é natural em
você - isso vai além de cor da pele, textura do cabelo ou tamanho da
roupa.
Abaixo um depoimento de Thays:
"Desde que me entendo por gente, escuto as
pessoas falarem no tal 'padrão de beleza'. Isso só foi criado pra que a baixinha,
a gordinha ou a “pretinha do cabelo ruim” (porque é assim que sempre dizem) se
olharem no espelho e se sentirem como o patinho feio. E isso é ridículo! Cada
um é e pode ser do jeito que bem entender! Sempre fui gordinha e (quando
me importava com opiniões alheias) sofria muito com o preconceito. Foi um longo
caminho até fazer com que as pessoas aceitassem e respeitassem minha escolha de
ser como sou. Hoje, o plus size está em alta, vemos muitos sites,
blogs e noticias mostrando mulheres despreocupadas com seu manequim e sem medo
de mostrar suas curvas, mulheres que se aceitam e se amam acima de tudo, e fico
muito contente quando vejo isso! Ver mulheres que, assim como eu, viviam
escondidas, com medo de possíveis julgamentos, lutando pra acabar com esse
preconceito bobo e para mostrar que, mesmo dentro de um manequim 46, também
pode ser uma mulher linda e desejada, é um motivo de orgulho pra todas
nós! Mas a luta não para aqui!...Dentro desse mundo Plus size vemos
mulheres lindas, modelos desfilando suas curvas em passarelas, ensaios
fotográficos, catálogos e mais catálogos. Mas e as plus sizes negras? Onde
estão? Pode parecer mania de perseguição, mas não é! Sejamos
sinceros, o preconceito com os negros sempre existiu e, infelizmente, sempre
vai existir. E, lamentavelmente não fugimos disso nem no mundo plus size. É um
preconceito maquiado, dentro de um ambiente onde a ideia principal é acabar com
a polêmica que envolve as mulheres plus sizes. Gente, não to dizendo que
temos que nos fazer de vitimas. Muito pelo contrario! Como Plus
Sizes já quebramos o tabu de que mulheres acima do peso não têm lugar na
sociedade, agora é a vez de mostrar que a Plus Size negra também pode estampar
a capa de uma revista, ou fazer ensaios fotográficos maravilhosos como todas as
outras! Se a mulher, por ter a pele negra sofre muito preconceito e a
mulher gorda também sofre o mesmo ou mais, eu sendo negra e gorda sofro em
dobro, e por isso vejo dois motivos a mais para lutar contra isso! Não é meu
tom de pele, nem meu manequim que irão determinar se sou linda ou não, mas sim
a maneira com que me sinto e me vejo: negra, gorda e linda!"