MULHERES PRETAS QUE MOVIMENTAM #1 - LUEDJI LUNA

por Karina Vieira
Foto: Alile Dara

     Em Julho é comemorado o mês da mulher negra latina americana e caribenha e para homenagear todas as mulheres pretas que fazem acontecer, lançaremos durante o mês, uma série de entrevistas com mulheres incríveis que o mundo tem que conhecer. Cantoras, fotógrafas, artistas, bailarinas, produtoras, psicólogas, filósofas, comunicólogas... Mulheres que fazem a diferença em suas áreas e na vida de outras mulheres. Inspiração. Abrindo a série Mulheres Pretas que Movimentam, conheçam: Luedji Luna.


Foto: Nti Uirá

     Conheci a música linda de Luedji Luna (ouçam: Dentro Ali) quando estava passando pelo momento mais difícil da minha vida, a passagem de minha mãe. Em versos como "Caso esteja por vir/me reconheça ali/em um domingo de sol/ou um dia qualquer/ apareça!" Luedji me acalentou com sua sonoridade intimista e carinhosa, com sua voz tranquila e malemolência baiana e me acalmou como poucas vezes senti ao ser tocada por alguma canção. Luedji é pura poesia e na entrevista que segue vocês poderão conhecer um pouco mais dela.

MBP - Quem é Luedji Luna?
LUEDJI - Eu sou Luedji Luna, filha de Adelaide Santa Rita e Orlando Santa Rita, neta de Maria da Paixão Santa Rita e Eliezer Santa Rita, e de Eutália de Jesus Gomes e Lorival de Jesus Gomes. Mulher, preta, baiana, cantora e compositora.

MBP - O que te levou a escolher a sua profissão?
LL - Eu não escolhi a música, foi ela quem me escolheu!

MBP - Como foi o caminho da sua graduação? 
LL - Foi um caminho árduo, porque foi um caminho de negação do meu próprio caminho. Eu não estudei música, não me formei em música, negava a música a todo custo, a custo da minha própria saúde mental, emocional, espiritual, eu jamais seria cantora, eu jamais viveria de música, isso não estava dentro do projeto político e de vida dos que me antecederam, por essa razão eu passei numa universidade pública, fui uma boa aluna, e fiz um curso tradicional, mas aquilo que tem de ser tem muita força. Hoje eu sou!

MBP - Como se deu a descoberta da sua negritude?
LL - Eu acredito que a descoberta da minha negritude é um processo, ela é uma descoberta contínua, porque temos muita coisa do racismo pra desconstruir, e ainda há muito o que se curar. No meu caso, eu acredito que essa descoberta se deu na medida em que eu comecei a me posicionar politicamente, a agir no mundo nesse sentido, foi com a militância, a negritude é um ser/fazer. Eu nunca tive crise de identidade, nunca me vi como uma mulher branca, ou quis ser uma, sou de uma cidade onde mais da metade da população é negra , que se sabe negra, e que cultua essa raiz,  sou filha de pais militantes, que me deram um nome africano, portanto, ser negra, e saber-me negra nunca foi um dilema, a descoberta da minha negritude  acontece na medida em que começo a me colocar e interferir no mundo a partir do lugar de mulher negra, na medida do que posso, e do que sei fazer, que é arte. O que eu quero dizer com isso é que ser negro, e se reconhecer como negro, numa sociedade como a nossa, racista, genocida e segregadora, não basta pra ser negro.

MBP - Quem são as pretas e pretos que te inspiram?
LL - Minha mãe Adelaide Santa Rita, meu pai Orlando Santa Rita, minha tia Rita Santa Rita, Vilma Reis, e na música Nina Simone e Tiganá Santana.

MBP - Quem é aquela mulher preta que você conhece e quer que o mundo conheça também?
LL - Tatiana Nascimento. mulher, preta, lésbica, militante, e a poeta mais sensível que eu já conheci.

MBP - Na sua trajetória profissional o quanto avançamos e o que ainda temos que avançar?
LL - Na música é muito comum ver a mulher negra no lugar da sambista, e isso é maravilhoso. Pra mim cantar samba é uma missão, uma espécie de chamado mesmo; mas o samba é também, de certo modo, um lugar  imposto, é onde a mulher negra pode ter êxito e reconhecimento na carreira como cantora, muito pouco se fala das cantoras negras não sambistas, nossos ícones da MPB /Jazz/Bossa Nova são todas brancas, enquanto que Alaíde Costa, Zezé Motta, Daúde e tantas outras, são cantoras (algumas dessas também compositoras), sequer lembradas ou têm o reconhecimento que merecem. É desafiador ser cantora, negra, não sambista, e intérprete das próprias canções... Vanessa da Matta, Ellen Oléria, Larissa Luz, Anelis Assumpção são cantoautoras negras dessa geração que me mostram um caminho possível... Sigo! 

MBP - Como você lida com a sua estética negra?
LL - Eu me cuido com óleo de coco da cabeça aos pés, gosto de óleo de amêndoa também pra o corpo, uso óleo essencial de patchuli e perfume alfazema. É todo cuidado estético que eu tenho, rs.

MBP - O que é representatividade pra você?LL - Representatividade, no contexto que a gente vive, numa sociedade capitalista, onde quem detém os meios de produção, os meio de comunicação, onde quem ocupa os espaços de poder são pessoas brancas, é importante sim! Uma Thaís Araújo na TV, um Lázaro Ramos, e um Obama na presidência é importante sim. Parece que vivemos em um mundo que não é nosso, porque ele é hegemonicamente branco em todas as instâncias, nesse sentido, se ver representado no outro nos dá sentido de existência, e isso é muito. Mas é preciso pensar além, é preciso que a gente comece a construir nossos próprios espaços, e não ficarmos tão limitados a essa ideia de representação. Eu vejo a representatividade como um passo, uma estratégia, não o fim.

Saibam mais sobre a Luedji Luna:
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This entry was posted on 01/07/2016 and is filed under ,,,,. You can follow any responses to this entry through the RSS 2.0. You can leave a response.

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