ACHEI VOCÊ, CLEMENTINA!

por Élida Aquino

Foto: Pedro Murad

       Era um dia normal moderando a página. Fotos de lá, links de cá e, de repente, surge a dica: musical "Clementina, Cadê Você?", de volta ao Rio em curtíssima temporada popular, no Teatro João Caetano. Vibrei, mesmo sem saber o que acontecia por lá, e tratei de avisar pras Meninas todas. Lógico! Como não achar sensacional a ideia de ver uma mulher preta como eu, tão relevante na história do samba, tão pouco comentada e honrada na atualidade, ocupando o palco? Me digam? Fiquei ainda mais entusiasmada por querer conhecer mais dela e, quem sabe, absorver qualquer pontinha de inspiração.
  Facebook já havia avisado: "O espetáculo musical "Clementina, Cadê Você?"é uma justa e bela homenagem à saudosa Quelé, um dos mais importantes nomes da música popular brasileira." Acreditei e fui lá conferir. No último domingo (09/02), com meu cúmplice de odisseias culturais. Começou e de cara os seis atores em cena (Ana Carbatti, Bruno Barreto, Bruno Quixotte, Sergio Kauffmann, Vidal Assis e Wendell Bendelack) "musicaram" tudo. Não consegui parar de sorrir desde então. A qualidade musical é um ponto forte, se estende por toda a apresentação e vem em forma de interpretação de canções belíssimas (aproveito para parabenizar os atores, extremamente talentosos, que cantam e tocam tão bem quanto atuam) e eles vão das declarações sobre a infância, personalidade, fé, Mangueira, samba, amor, até a descoberta como cantora e a participação no Rosa de Ouro.
    Convidei o namorado Leandro Joaquim, super amante do samba, para dar a opinião masculina e inspirar outros meninos. Ele conta: "Era mais um domingão qualquer de 40 graus, clima cordialmente escaldante, e eu procurava opções de divertimento para desfrutar com a minha nobre moça. Fiquei inclinado a conferir algum filme indicado ao Oscar, porém o convite da minha digníssima para assistir Dona Clementina atiçou a curiosidade cultural. Pois bem, aceitei prontamente e fui. Espetacular do começo ao fim de uma hora e trinta minutos de espetáculo! A história da fenomenal Clementina é contada com riqueza de através da maravilhosa interpretação de Ana Carbatti e dos cinco ''músico-atores''. "Clementina, Cadê Você?" é uma obra-prima teatral e tornou o nosso domingo ainda mais lindo. Obrigado, rainha do partido alto!".

Foto: Pedro Murad
   
     Quando me perguntam o que mais admirei, digo que foi a transmissão pura, carregada de simplicidade e ao mesmo tempo luxuosa (já que a beleza da iluminação, figurino e Adriana não consegue passar despercebida), da intrepidez e sensibilidade que ela trazia. Era uma nêga de opinião, mas doce, doce... Tanto doce que transbordava em música. Música incrível. É por isso que ainda estou anestesiada pelo que vi e ouvi no domingo... Só posso tentar expressar num singelo “muito obrigada” minha gratidão aos envolvidos com esta obra genial e útil, de resgate e reconhecimento. Foi um espelho pra mim. Pra vocês que estão pelo Rio, fica o convite! Não percam a chance de ver de pertinho. Vai até o dia 23/02, aos fins de semana (Sexta e Sábado às 20h, Domingo às 19h30) no Teatro João Caetano (Praça Tiradentes, s/n, Centro - Rio de Janeiro. Telefones: (21) 23329166, 23329258 e para a bilheteria: 23329257).

Foto: Pedro Murad
       De Valença para Osvaldo Cruz e o surgimento da Portela, depois pra Mangueira e muito amor à Verde-e-Rosa. Sempre do samba. Defensora e guardiã da ancestralidade, traduziu no canto o "ser África" e como guarda-la viva no coração e nas tradições. Descoberta aos 63? É só um detalhe. Minha vó diz que "quem é bom já nasce pronto" e foi assim. Humildade, ternura e garra. Clementina, Tina, Quelé, Rainha Ginga, Mãe ou o que couber dizer, inspiração é o que não falta pra gente, mulher preta jovem, copiar pra vida. Ainda bem que deu tempo de encontra-la! Salve especial e cheio de carinho para todas as matriarcas que nos deixam exemplos bons pra seguir.
      Encerro com as palavras de denúncia que Quelé registrou no samba "Assim não, Zambi". Que inspire vocês como inspirou a mim.
"... Eu não quero essa vida não, Zambi
Ninguém quer essa vida assim não, Zambi
Eu não quero as crianças roubando
A véinha esmolando uma xepa na feira
Eu não quero esse medo estampado
Na cara duns nêgo sem eira nem beira
Abre as cadeias pros inocentes
Dá liberdade pros homens de opinião
Quando um nêgo tá morto de fome
Um outro não tem o que comer
Quando um nêgo tá num pau-de-arara
Tem nêgo penando num outro sofrer..."

This entry was posted on 14/02/2014 and is filed under ,,,,,,. You can follow any responses to this entry through the RSS 2.0. You can leave a response.

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